domingo, 6 de setembro de 2015

Três reinados e um resgate

                     
           Há um país, um pequeno país, de povo simples... Sem ganância, um povo que sonha demais em alcançar o estritamente necessário para sua existência pacífica nesta terra. Trata-se de um país até certo ponto fechado para relações exteriores, como negociações políticas, territoriais e que envolvam qualquer tipo de ganho ou de perda. O governo deste país é extremamente único, é uma monarquia, porém ordenada por um patriarca. O pai foi o fundador do país, ele não o rege de fato, mas intervém em casos extremos... Não coroa reis e tão pouco faz parte do conselho real, há alguns poucos que creem que ele sequer existe, que é mítico, e é mais um ideal do que propriamente uma pessoa, mas não dentro dos limites do país, ali, todos que nascem aprendem a ouvir , respeitar e amar o grande PAI.
                   O conselho elege aquele que governa, e por uma década o país é reinado pelo escolhido e respeitado rei.  Os primeiros dez anos do país foram de progresso, de expansão e prosperidade, o primeiro rei se chamava INTENSIDADE e ele era muito determinado, fazia mil coisas ao mesmo tempo, criou leis, expandiu fronteiras, pavimentou ruas e construiu pontes... Modernizou todos os sistemas vitais do reino, como  abastecimento e educação, energia o país até exportava... Porém, ao fim dos dez anos, toda essa sede por liberdade e progresso custou caro ao país, em apenas seis anos, INTENSIDADE havia posto o país no mapa, mas a um preço tão alto que quase levou o país a ruína, e todos os recursos ficaram escassos pelos últimos quatro anos de seu reinado. Então o conselho nomeou o segundo rei: CORAÇÃO.
                O reinado de CORAÇÃO foi um dos melhores para o país, ele era bondoso, honrado e piedoso... Foram dois anos de dificuldade, pois o reinado de INTENSIDADE quase faliu o país, mas  CORAÇÃO  fez um excelente trabalho de recuperação, com um tom idealista convenceu todos a trabalhar em prol da nação, e todos saíram da crise juntos. CORAÇÃO era tão bondoso que isso despertou algo que até então não existia no reino... Inimigos. Muitos achavam que CORAÇÃO era tão tolo que se os estrangeiros viessem e o pedisse, ele daria de bom grado parte da riqueza que o país agora acumulara para momentos mais difíceis. De fato, coração erra assim mesmo, dava sem receber... Amava sem ser amado, acreditando que era amado... CORAÇÃO era talvez um dos mais sonhadores... Ele era movido por um amor cego e feroz que perdia completamente o sentido de tudo, CORAÇÃO queria felicidade, era isso que ele buscava para si, e para todos em seu reino... E ele se atirou, arriscou tudo,  a vida, a reputação, a sanidade, e a coroa pela tal felicidade que não viria... E por influência desse grupo de inimigos, um dos membros mais importantes do conselho, RAZÃO achou que era hora de por fim ao reinado de CORAÇÃO, eles o chamaram de louco, e temiam pelo que essa “loucura” podia fazer ao país. E, por medo de tudo o que aconteceu no reinado de INTENSIDADE se repetir com o de CORAÇÃO, eles o depuseram no oitavo ano do seu governo... Com ainda dois anos pela frente por reinar, CORAÇÃO foi humilhado e se exilou nas montanhas ao sul onde viveria se corroendo de amargura eternamente, era o que estava determinado a fazer, e no meio da noite, CORAÇÃO cavalgou para a cabana de uma amiga de infância, nos confins do reino. RAZÃO ouviu a oposição e logo proclamou o nome do novo rei: CORPO.
               CORPO, mal se sentou ao trono, e mal foi coroado e já mostrava pulso firme, e imediatismo. Acho que, todo país tem uma história que quer esquecer, que não se orgulha de por nos livros de história... Ali começava a era negra daquele país. CORPO era sedento como INTENSIDADE, mas de saciar a si mesmo, era corrupto, pecaminoso... Vivia em luxúria e esbanjando tudo o que tinha. CORPO se esqueceu de que estava à frente de um povo que carecia de prioridades, educação, alimentos, condições básicas de sobrevivência... CORPO dava de ombros para essas prioridades, e não dava ouvidos ao conselho, isolando-os numa ala do castelo e dando ordens para que ficassem incomunicáveis. Aquele que o proclamara rei, foi o que mais padeceu no reinado de CORPO, seu pagamento foram 10 anos na masmorra do castelo, por tentar reparar o erro... RAZÃO tentou em vão mostrar a corpo que o povo sofria, que algo precisava ser feito, que existiam responsabilidades, mas CORPO não respeitava ninguém, nem a si mesmo... E enchendo-se de RAZÃO mandou que o prendessem. Ao fim da década, o povo ficara na miséria, a infelicidade tomou conta do país e não restava quase nada de recurso, e CORPO só deixaria o trono quando este secasse por completo. Foi aí que RAZÃO mandou um recado para uma conselheira que estava na torre isolada, para procurar por AMOR, uma vez que INTENSIDADE havia morrido há alguns anos, e com ajuda de outros conselheiros menos influentes ela fugiu da torre e foi ao encontro de AMOR. Ela era a única que sabia onde encontrá-lo, pois era em sua cabana que AMOR se refugiara. Após três noites de viagem, ESPERANÇA chegou onde AMOR estava... E, como FRANQUEZA tinha dito, AMOR estava velho e sombrio, devorava a si mesmo todos os dias e não via mais o céu, não sabia mais do tempo, nem do espaço... AMOR não sabia sequer quem era mais, AMOR estava desolado, doente e triste. Mas mesmo sem reconhecer a velha amiga, no momento que AMOR pôs os olhos em ESPERANÇA ele soube que sua vida ganharia novo sentido. ESPERANÇA sentou-se ao lado de AMOR e sob o luar lhe contou tudo o que acontecera desde que deixou o reino... Ela e RAZÃO teriam um plano de golpe no governo de CORPO e ESPÍRITO dizia que nem o grande pai suportava mais ver o país se envenenando por CORPO, que daria o aval ao tal golpe, ainda que não gostasse de se envolver. ESPERANÇA sabia como cativar AMOR, e logo ele se revigorou... Levantou-se e partiu com ESPERANÇA rumo ao reino. O povo se hipnotizava ao ver AMOR novamente, muitos achavam que ele tinha morrido... AMOR e ESPERANÇA não tiveram trabalho algum, pois nem a guarda real era leal a CORPO mais, CORPO estava sozinho. De tanto fazer mal aos outros e encher a si mesmo de pequenos prazeres, estava só. Naquele histórico dia, o sol apareceu dentre as nuvens e os rostos cansados sorriam, o país renascia enfim. AMOR tomou de corpo a coroa e a tão sonhada felicidade veio por três anos. Nada, absolutamente nada, tirava AMOR do seu foco, ele enfim tinha alcançado o objetivo... ESPERANÇA E RAZÃO sabiam, que se AMOR se apaixonasse novamente, ainda que por ideais, por uma luta, ele se atiraria, pois é de sua natureza... Os três foram criados juntos, e ela o conhecia como ninguém. RAZÃO, porém, resolveu não mais interferir. E coube a ESPERANÇA tentar acordar AMOR do transe. Mas novamente, AMOR estava cego pelos seus sentimentos.
                         ESPERANÇA era uma anciã, que embora carregasse consigo muita luz, já estava cansada, e os anos de reclusão no castelo, fez com que uma geração inteira não a conhecesse, ela havia se tornado um mito, assim como AMOR. Mas ainda que como último esforço, ela tinha que salvar o grande amigo, não podia vê-lo chocar o barco contra as rochas como RAZÃO achava que ele faria em seu primeiro reinado, e interviu. ESPERANÇA caminhou uma semana e subiu a montanha mais alta onde mora ESPÍRITO, o mais velho dos conselheiros, o mais respeitado, por ter contato direto como grande PAI. ESPERANÇA suplicou a ESPÍRITO por AMOR, disse que o amigo estava preso nos próprios sonhos e nos sentimentos, e que RAZÃO não queria se envolver novamente, embora ficasse nítido que RAZÃO era o mais indicado para reinar, ESPÍRITO falou com o grande pai e junto de ESPERANÇA, convenceu AMOR a deixá-los que o ajudassem.

                        E foi assim aconteceu o grande resgate. Uma comissão formada por RAZÃO e ESPÍRITO, com AMOR e ESPERANÇA num segundo plano, um por razões emocionais e outro por cansaço ( AMOR tem tentado se voltar ao grande PAI e ESPERANÇA procura forças) reina o país. Juntos, eles prenderam CORPO na mesma cela em que RAZÃO ficou no calabouço, não por vingança, mas para que se lembrem de que o mal existe. Claro que o país enfrentou muitas outras dificuldades, houve desespero e lágrimas, houve dores e perdas, saudades, , decepções e uma tristeza enorme... Mas é exatamente neste momento que ESPERANÇA e AMOR se unem a ESPÍRITO E RAZÃO, dando pão a quem tem fome, tratando as feridas dos doentes... Tentando por um sorriso no rosto de quem só chora. O povo tem se reerguido, e com ele o país tem se reerguido, ao menos recuperado o rumo, o sentido... O grande pai, enfim tem se alegrado, pois finalmente,  seus pupilos deram as mãos e entenderam que nenhuma folha cai de uma árvore senão da vontade dele. O tempo das coisas não pertence aos homens e sim ao PAI. Se RAZÃO um dia reinará... Se ESPERANÇA vai ser renovada, e se o AMOR vai ter forças para se libertar isso o tempo dirá, enquanto isso... Os três são guiados por ESPÍRITO e este, abençoado pelo grande PAI.