Sentimentalmente falando, depois da humilhação e da
rejeição, seja amorosa ou preconceituosa, a decepção é a que causa mais
estragos ao coração e a alma do ser humano. Eu tenho sérios motivos para crer
que todos nós algum dia já sofremos uma decepção, ou maiores daquelas que abrem
um buraco no coração e nos incapacita de confiar em qualquer que seja, ou
aquela mais tola como não guardar um simples segredo confiado a alguém.
É difícil policiar-se sobre decepção, pois quem é verdadeiro
claro e sincero, pode, ainda que não seja intencional magoar alguém,
decepcionar... Implodir a imagem boa que essa pessoa tem de ti. Bastam
palavras, gestos e tudo se esvaem como areia entre os dedos. Mas quem seria o
culpado pela decepção? O ser que decepciona? Ou quem é decepcionado? Quem
decepciona é sempre o culpado em nível de conhecimento social, porém a trama é
mais complexa. Esquecemos-nos sempre de
dimensionar as coisas. Quando conhecemos alguém, e o encanto se torna real, nos
tirando a lucidez, saímos do chão e da lógica, esperamos sempre os melhores
gestos, as melhores decisões daquela pessoa tão “fabulosa” que acabamos de
conhecer, afinal, beberam em suas palavras...
Somos nós quem depositamos uma confiança desmedida, nutrimos
uma expectativa surreal sobre a pessoa que nem sequer desconfia, e quando
assaltados pela flagrante simplicidade do ser, disparamos contra o nosso
próprio coração palavras firmes de desencanto como: “É só isso?” “Esperava mais
de você...” Fantasiamos tanto com a perfeição que queremos em alguém que
desabamos ao não encontra-la mais uma vez, vestimos a pessoa com tudo o que
sempre sonhamos de bom, honestidade, retidão, alinhamento de intelecto,
paridade sentimental, lealdade e fidelidade. Porém, nos esquecemos de um mero
detalhe... O perfeito inexiste! O perfeito é o que nos completa e ponto.
A imperfeição é a ruga na testa da vida, está sempre ali,
com todos nós. Todos somos imperfeitos de alguma forma ou não seria imperfeição
achar-se perfeito? Soberba! Somos imperfeitos, todos nós. Não há dono da
verdade e soberano em comportamento, somos mortais e imperfeitos. Santos não
caminham nessa terra, somente homens e mulheres que como tais são oriundos do
pecado.
Se um dia eu pudesse fazer apenas uma pergunta ao criador
sobre a essência da humanidade, seria: “Senhor, porque temos esse dom da
decepção?” – Porque quem ama sofre tanto? Em qualquer balança, colocamos um
peso dobrado em relação ao peso que a pessoa amada. Esperamos sempre um amor em
igual proporção... Sempre uma via de mão dupla. Será que somos individuais até
na forma de amar, de demonstrar ou não isso? Aí é que mora a dúvida. Somos nós
que esperamos demais das pessoas? Ou as pessoas que não estão nem aí para o que
sentimos?
Independente do que seja uma coisa é certa, somos
decepcionantes e decepcionados na mesma proporção até o dia que percebemos que
é exatamente o imperfeito do outro que nos fascina, nos encanta... Seja
provocante, seja libertador ou até mesmo para tentar uma vã correção dessa
imperfeição. O que é de fato inegável é que desconhecemos o amor divino, aquele
incondicional... Esperamos sim, sempre algo em troca, ou de volta e assim, a
velha fábrica de decepções continua a expelir sua fumaça... E os corações
seguem sofrendo, pois o vazio de um adeus é pequeno frente ao buraco que uma
decepção faz em nosso peito, em nossa alma.