quarta-feira, 22 de agosto de 2018

Pontes ou represas


                   
Nós, seres humanos, fomos criados em nossa essência para nos ligarmos uns aos outros, em igualdade e amor... Sempre fazemos algo, é por alguém, é com alguém e a alguém...Em tudo sermos elos.... Seja influenciando ou simplesmente doando, ensinando a alguma outra pessoa o que temos como relevante em nossa história, para o bem ou para o mal. Ser ponte é trazer o sentimento à uma visão superficial, é trazer razão onde antes só haviam instintos, é mostrar-se como um todo, sendo ou não um caminho a ser seguido, uma história a ser contada. E como toda ponte, o que mais importa são as bases dessa construção elevada, pontes são caminhos erguidos por homens para levarem outros homens a locais que desejam ir... E sempre avançam sobre as águas, como se desafiássemos a natureza e toda sua sapiência, ou sobre precipícios, como se o medo de cair não existisse, mas ele existe. É bem real.
                                         As bases de qualquer construção são de suma importância para que não sucumba ao tempo, ao peso, ao descaso... E geralmente a nossa base, como pontes é a família... Solo árido ou fértil que sempre nos fortalece, nos mantem ali... imponentes, quase fortes, capazes de suportar mais um dia de sol, mais uma chuva, mais uma enchente, mais uma carga. Mais uma batida...Sempre são por nós, o fundamento de tudo...seja gratidão, ou ingratidão, esses sentimentos ninguém nos ensina, mas é da família que se fala disso pela primeira vez. Quando temos filhos, é curioso ver como esse termo ponte se faz mais plausível...queremos sempre que façam seus caminhos, mas que jamais cometam nossos erros...Sem aceitarmos sequer que, mesmo não cometendo os nossos, cometerão os deles... E então eles se tornam, não somente a fundação que parte do fundo dos rios, ou do solo pedregoso... Mas também se tornam a água que tentamos proteger... Que não queremos que as botas ou rodas de ninguém sequer encoste neles...E a nossa força se renova, parecemos então, de fato incapazes de cair... Despencar, aguentamos vagões e vagões de sentimentos passando por nossas vidas, para que tudo siga inalteradamente coeso para eles...
                                      Mas quando surgem as primeiras trincas percebemos... Que não somos fortes. Não tanto quanto achávamos... Não tanto quanto parecíamos ser, para os outros, para eles...Somos frágeis, quebradiços...Carentes de cuidados como qualquer um...Afinal... O que fizemos por nós mesmos? E os sentimentos que por nós passaram? Se foram! E só aí reparamos que o sentido de ser ponte, pode estar em levarmos felicidade de um lado a outro, mas o que fica para nós é somente a lembrança... E a sensação enganosa de termos feito tudo de melhor que era possível...De termos suportado todo o peso, das botas, dos pneus, da correnteza, das tempestades...E então nos questionamos se somos mesmo pontes... Ou seríamos represas? Segurando tanta coisa... Suportando, nos vestindo de fortes... E as trincas deixam passar...Do trabalho para casa, e de casa para o trabalho... E de pouco a pouco as partes se inundam...Se misturam...E não temos como fazer os reparos...Não temos tempo ou forças...E pensamentos sombrios nos sondam... Questionamentos bizarros, sobre valores, sobre o que somos ou realmente representamos para quem levamos felicidades, ou sorrisos...Ou até mesmo, se realmente levamos isso para as pessoas... Nos preocupamos tanto em conter os vazamentos, em omitir nossas rachaduras  para que as águas mansas não se misturassem com as revoltas, que no fim... Nos despedaçamos, e as águas... Seguem o fluxo, com ou sem correntezas... Com ou sem inundações, com ou sem enchentes.
                                     Então, quando só restarem nossos escombros... Como pontes, ou como represas no fundo das águas ou em meio ao solo, a assustadora ideia de que protegemos demais o que poderia se proteger sozinho, que levamos amores e sorrisos demais, e absolvemos de menos...Talvez o rio devesse de fato seguir o fluxo, os pés deveriam se molhar, o sol deveria refletir em suas águas... Daí, ficaria a certeza... Os carros encontrarão outro caminho... As pessoas atravessarão o rio, e nos daremos conta de que nada pode ficar entre o destino e o seu cumprimento...A vida sempre encontra um caminho, um jeito. Talvez, devêssemos tentar ao menos uma vez, sermos quem passa pela ponte ou sermos simplesmente, o rio... Talvez...

quinta-feira, 31 de maio de 2018

Fundo falso


                                     Eu sei, mesmo em meio ao total silêncio e cobertos pela cortina de fumaça ainda sentimos ali.... Roubando-nos paz e quietude da alma...E todas as cores da nossa aquarela parecem se misturar, tornando-se um borrão sem sentido.... Pagamos caro pelos sorrisos que damos, e cada um emoldurando um dia diferente, com uma mescla de resiliência e gratidão, mas as coisas não ficam, nunca cem por cento... Sempre, há uma pendência ou outra, sempre há uma cobrança, uma culpa, uma pedra, uma cruz...Sempre há esse um por cento, que por mais fé, coragem e vontade não derrubamos. Posso estar errado em supor, errado em generalizar, claro, podem haver aqueles cem por cento felizes, livres do pecado, de bem com suas escolhas, em paz com seus passos e felizes com seus caminhos.... De fato, pode ser... Mas sei que existem pessoas que se identificariam com o que descrevo.... Ao contrário do que pensamos logo ao início dessa conclusão não nos falta nada.... Não é falta de amor ou de fé em Deus, é exatamente o oposto, é êxtase... Estamos cheios de nós mesmos... A grande maioria vive de trabalhar naquilo que nunca sonhou, ganha o suficiente para comprar seu próprio silêncio... Propina para seu status...  Mas é quando se olha no espelho.... Quando se deita no travesseiro.... Quando a ressaca acaba, quando a tinta cai.... Que nos vemos ali, insatisfeitos.
                                 Somos, por natureza, insaciáveis de tudo, seja do espirito santo, seja de bens matérias, seja do amor do outro.... Por que sempre achamos que damos muito mais do que recebemos, que somos vítimas da injustiça e achamos que a resolução mais simples é empacotamos tudo para viagem com rótulo de azar.... Não há azar, nunca houve. Somos nós.... Em nossa essência mais verdadeira. Falhos e fracos, e carentes como sempre. Daí tudo ao redor nos sufoca e escraviza... A violência, a injustiça, a corrupção, a desumanidade, o desamor... Mas somos os elos dessa corrente... Só não queremos ver. A humanidade tem evoluído em seu egoísmo, ou melhor dizendo, egocentrismo... Não há barreiras ou guerras físicas maiores do que as que estamos construindo com nossas mentes, estamos nos afastando, ampliando nossos limites para além das fronteiras onde começam o direito dos outros...
                                   O amor, esse anda triste e em depressão, foi julgado e condenado...  Substituído pelo sexo casual e pela infinita guerra de gêneros que outrora era impensável. É outono para a paixão e o veraneio do amor está em baixa temporada. Seria tão mais simples se aceitássemos nossas imperfeições...  Seria tão mais simples se pudéssemos ver, que não há lado certo da corda num cabo de guerra entre o infeliz e o oportunista. Seria melhor se fossemos nós, falhos, fracos e pedindo perdão pelo que somos, de joelhos...  Não julgando uns aos outros sem se dar o trabalho de olhar para o espelho, não culpando os outros pelas suas escolhas, não culpando as pedras pelo caminho que você escolheu, não sorrindo infeliz, não cultuando o próprio corpo como se realmente desse valor a ele e, se contradizendo com frases de amor ao pai.... Não. Porque no fundo, sabemos...
                                    No fundo, no fundo, no fim do dia, da noite, da semana, do mês do ano... Da vida.... Não há cerveja, não há cigarro, não há maquiagem, não há drogas, não há mascaras de felicidade.... Vai tudo muito além de um status na rede social. No fim somos quem somos, e é isso que incomoda... O barulho ensurdecedor da silenciosa verdade. Daí os corpos no sótão que todos temos, os fantasmas que nos assombram, a culpa que nos tira o sono, o inconformismo com o tempo de Deus para tudo, sobressaem ao sorriso latente dizendo: “sextou” ou às viagens do corpo que não alimentam a alma. Moramos no fundo falso da gaveta, abaixo da superfície do visível, submersos ao mundo perfeito e a cuidados extremos para nos protegermos de tudo, menos de nós mesmos. Fomos pintados à mão numa tela perfeita, e como retribuição.... Erguemos estátuas à nós mesmos. Criados pelo amor, e para amar.... Chegamos ao ponto de evitarmos uns aos outros, por medo de nossas lástimas serem incompatíveis, ou pela desculpa absurda de pouparmos o outro de nós mesmos em nosso estado pleno. Desta forma, por mais momentos felizes (que sim, existem, embora raros) que possamos colecionar, poderemos adoecer pela falta de paz.... De aceitação do que somos, de amor próprio.... Pois é bíblico, amar ao próximo como a ti mesmo.... E se não conseguimos nem mesmo nos amar.... Como amaremos alguém? Pratiquemos a confiança e aceitação. Quem sabe assim, essa sensação de que nunca ficamos cem por cento diminua? E que Deus siga nos abençoando!

domingo, 25 de março de 2018

A corda


          É quase imperceptível o quanto nos amarramos, nos enlaçamos… Todo o tempo, e a vida inteira…. Em pessoas, em coisas, em lugares, em carreiras. Mas o irônico é que quando o laço vira nó, todos querem desatar, sentimos o ar se esvair, sufocados e quase sem força, no ápice do desespero buscamos algo cortante, para que o mais rápido possível venha o alívio, o ar…. Para que possamos respirar…
                A corda que prende é a mesma que salva, por vezes nos encontramos tão no fundo de algum desses milhões de poços desespero que a vida tem…. Daqueles que geram frases motivacionais como: “O bom de chegar ao fundo é que só se pode ir para cima…“ oramos sistematicamente por alguém que apareça e nos jogue uma corda…Mas o nosso maior desejo pelo menos uma vez por semana é cortar as cordas e ir para bem longe… Viajar, esquecer, mudar, viver sem preocupações. Até mesmo pessoas como eu, cuja maior ganância é uma rede numa varanda colonial vendo o sol encontrar o mar no fim da tarde, dependem da elasticidade dessa corda. Afinal, sempre tem um porém…Seria um sonho inviável perceber o quanto podemos ser felizes com poucas coisas, investir numa qualidade de vida maior que uma qualidade salarial… A vida te pede mais, sempre mais e mais…. Hoje a realidade é de um nó apertadíssimo. Quem tem um trabalho está se destruindo mil vezes mais rápido que há dez anos atrás pois se trabalha hoje pelos milhões que foram demitidos e estão do outro lado da corda, aquela do poço…. Não se come, não se dorme, não se vive com uma ameaça dessas sobre a cabeça. E a cada dia, a corda diminui, e o nó aperta mais.
             Há ainda os laços familiares por que não? Sim, são os melhores, é onde a trama da corda é mais forte...Mas é onde alguns formadores de opinião se concentram, munidos de uma faca, tentando cortar uma trama já puída por conceitos,discussões sobre direitos, gêneros e desamor...Mas ainda é a trama mais forte, a que de fato, prende-nos, não permite que batamos nossas asas de cera rumo a noção adolescente de liberdade. Não somos reféns amarrados uns aos outros… Somos ata dos por nós de amor. Claro, que confiar em quem amamos nem sempre é a garantia de lealdade ou preventivo de decepção, mas é sem sombra de dúvida a opção mais plausível sob pressão …
              Então, qual a corda que te prende? Qual a corda que te resgata? O que mais te aperta? O que mais te sufoca? O laço? O nó? Estamos do mesmo lado da corda? Ou somos apenas o ioiô que nela passeia? O fato é que devemos acordar! Assim como não há liberdade sem luta, não há luta que signifique algo se morrermos em meio a batalha. Não abro mão do meu sonho, mas sei o que me custaria realizá-lo…Viver sem os nós, e sem os laços tão necessários… E cortar a corda ao invés de desatar nó a nó. E eu tento sempre acreditar que…. Se só podemos ir para cima…E temos a corda…. Não posso cortá-la pois pode ter mais alguém precisando subir… Precisando de algo para se apegar, para se salvar, para sair dali....Então seja você … A corda.